Encostada na porção portobelense da Costeira de Zimbros jaz um par de grossas paredes em estado de deterioração. Tomada pelo mato, distanciada do olhar curioso por uma cerca de arame indicando propriedade particular, o que restou da Casa Branca caminha para se tornar apenas parte do folclore da comunidade de Santa Luzia. Um vestígio do passado temperado a história e lenda de que pouco se fala hoje em dia, mas que um projeto audiovisual tratou de recuperar. “Memórias da Casa Branca”, documentário produzido pelo Retratos de Porto Belo com recursos da Lei Paulo Gustavo de Incentivo à Cultura, já está disponível no canal do projeto no YouTube.
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Como é característico do trabalho desenvolvido em Retratos de Porto Belo, os realizadores foram buscar na memória dos moradores de Santa Luzia um olhar sobre a Casa Branca. Desse manancial, retiraram histórias que misturam fato e ficção e denotam uma presença ainda marcante entre quem vive naquele canto do município, separado de Tijucas pelo rio de Santa Luzia.
Fatos que remontam a tempos sombrios: a Casa Branca foi sede de uma fazenda escravocrata. “Tinha uma taipa de pedra, tipo um portal, onde tinha uma argola de ferro, e era ali onde eles açoitavam os escravos”, descreve o empresário local Mauri da Silva, um dos entrevistados para o documentário. Atualmente, nenhum vestígio desse passado resta entre a vegetação que cobre a propriedade, em cujos fundos há uma cachoeira que abastece de água potável a comunidade. Porém, um desenlace dramático foi registrado: em 1842, Francisco da Costa atirou contra seu senhor, através de uma calha do alambique. Antônio da Silva, proprietário da Casa Branca, morreu. Francisco foi sentenciado à morte. Ele foi enforcado na praia do Baixio, em 1846.
A história calou fundo no imaginário popular. “Ele era um coronel grande, né? Decerto veio de fora, e um escravo matou ele ali dentro do cocho, é o que eles contavam. Era o que eu escutava, quando tinha uns dez, 12 anos. O seu Adelino botava um cigarro da boca, um paletó por cima, e ficava na venda contando essas histórias”, lembra o agricultor Valmor Alexandre.
Com o tempo, a história ganhou contornos fantásticos e as gerações que conviveram com a Casa Branca cultivaram lendas sobre assombrações e tesouros escondidos. Tinha quem levava a sério, a ponto de manter distância segura da casa; ou a ponto de cavoucar a terra em volta em busca de dinheiro. Não consta que alguém tenha achado ou visto alguma coisa, mas a aura de mistério permaneceu. Até o final dos anos de 1970, a Casa Branca ainda estava de pé, seus últimos residentes contavam de um quarto repleto de círios e coroas fúnebres, falavam de ventos que partiam de lugar nenhum e de sonhos que indicavam onde havia riqueza. Uma noite, o telhado da casa enfim desabou, o assoalho foi saqueado e o que restou, aos poucos, o mato encobriu.
Os moradores ouvidos pela equipe do Retratos foram unânimes em afirmar que a Casa Branca merece um destino melhor que o total desaparecimento. “A gente fica meio triste porque a história vai se perdendo”, lamenta Mauri da Silva. “Ali poderia funcionar, tipo, um museu. Por que não?”. Se o museu parece um sonho fadado ao desengano, como outros que a Casa Branca inspirou, ao menos parte dessa memória ficará à distância de um play, disponível nos canais do projeto Retratos de Porto Belo. O link para essa viagem no tempo segue abaixo:
Idealizado e produzido pelos jornalistas Thiago Furtado e Alcides Mafra e pela fotógrafa e produtora audiovisual Isadora Manerich, Retratos de Porto Belo coleciona memórias da cidade que dá nome ao projeto desde setembro de 2015, publicando reportagens e videodocumentários sobre moradores tradicionais e contemporâneos da cidade. Em 2016, foi contemplado com o edital de incentivo à cultura do Governo de Porto Belo.